Para ler ouvindo: “On Track”, do Tame Impala.
1.
Mais um ano. E sempre que escuto o álbum The Slow Rush, do Tame Impala, sou automaticamente transportado para aquele apartamento do número 99 da Huay Kaew Road em Chiang Mai, na Tailândia. O ar empesteado com uma mistura de Rexona Dark Temptation e o pad thai de R$ 5 do restaurante da esquina.
2.
Embora eu tenha o costume de anotar ideias, não mantenho um diário de viagens ou algo do tipo (deveria). Passageiro é, de certa forma, um livro de memórias – e não tem nada melhor para desbloqueá-las, no meu caso, do que ouvir a(s) música(s) que eu costumava ouvir na época da cena que estou escrevendo.
Ainda não se sabe muito bem o porquê, mas a música tem esse poder de desbloquear memórias – e é, inclusive, uma das poucas armas que os terapeutas têm para lidar com o avanço do mal de Alzheimer, como mostra essa matéria da BBC.
"A música tem a capacidade dupla de criar e recuperar memórias dentro do cérebro humano", diz a psicóloga Lucía Amoruso, pesquisadora da Universidade de Buenos Aires na Argentina, que investiga aspectos do comportamento e da música.
Quando estou escrevendo não gosto de ouvir músicas com letras, prefiro as instrumentais, porém, tenho repetido um ritual antes de começar a escrever sobre uma história que se passa em determinada época e cidade: no momento pré-escrita, aquele em que leio minhas notas enquanto tomo café, coloco para tocar músicas que façam parte daquela memória – um jeito de tentar desbloqueá-la e recriar aquela atmosfera.
3.
Em alguma das edições desta newsletter (fiquei com preguiça de pesquisar em qual), escrevi que, muito provavelmente, terminaria o livro até o Natal (só não falei de qual ano…).
O Scrivener tem uma ferramenta em que podemos criar uma meta de palavras. Segundo o software, se a partir da próxima semana eu escrever 1.500 palavras por dia, contando apenas os dias úteis, finalizo a obra em 31 de janeiro de 2023.
Particularmente, acho que esse negócio de estipular um número x de palavras atrapalha mais do que ajuda. Gera uma ansiedade desnecessária – a não ser que você trabalhe com um prazo apertado, o que não é o meu caso.
Ainda de acordo com o Scrivener, essa semana foi a que menos escrevi – pouco mais de 1.000 palavras, uns seis parágrafos.
Na minha opinião, esse é o problema de se preocupar com esses números: eu escrevi uns seis parágrafos super redondinhos que serão fundamentais dentro da narrativa que estou criando no livro. Parágrafos que não precisarei revisar lá na frente e que foram escritos artesanalmente, sem pressa, entre uma e outra xícara de café.
4.
2023 está na porta e meus primeiros rascunhos datam 2019.
Nessa Era do Imediatismo em que vivemos, onde tudo é muito rápido e dinâmico, é difícil não ficar ansioso cada vez que vejo um(a) escritor(a) lançando um novo trabalho ou ganhando um prêmio literário.
Por outro lado, esse intervalo de quatro anos entre um livro e outro me dá um certo alívio. Tenho certeza de que se eu tivesse lançado Passageiro antes, tentando pegar uma rebarba do hype em torno de Nômade Digital pós-Jabuti em 2020, me arrependeria. Eu teria lançado uma obra inacabada pela pressa de lançar logo um livro novo; não porque eu realmente tinha algo a dizer.
5.
Essa é a última edição da newsletter em 2022.
Agradeço, de coração, a companhia até aqui. Tenho adorado compartilhar com vocês o processo de escrita do livro e fico feliz a cada comentário recebido.
Ainda não faço ideia de quando o livro será lançado (não me deixem ansioso perguntando isso! haha), mas vocês certamente serão os(as) primeiros(as) a saber.
Um grande abraço e um ótimo 2023 pra gente! :)
✍️ Notas:
Você sabia que a newsletter tem uma playlist com todas as músicas indicadas aqui? Ela é atualizada semanalmente.
Um acidente de carro apagou a memória do inglês Thomas Leeds, mas, dez anos depois, uma canção pop dos anos 1980 desencadeou flashbacks.
Que tal tornar a escrita um hábito em 2023? Participe gratuitamente do Desafio 21 Dias de Escrita. Durante 21 dias você receberá por e-mail um exercício prático de escrita criativa.
Estou lendo Escrever para não enlouquecer, do Charles Bukowski, e gostando bastante.
Deixa ver se eu entendi: essa newsletter existe para anunciar um livro que está por vir!
Poxa, então se for este o caso, que demore muito a lançar o livro. :) É um grande prazer receber estas suas crônicas. Com essa periodicidade, você modificou o sentido da expressão "sextou!". :):):)
Bom ano pra você, Matheus!
PS: Já viu o videoclip de "Gnosis", do Russian Circles, do álbum de mesmo nome lançado neste 2022?
O bom de usar o Scrivener é que, mesmo nas ocasiões em que a produção é menor quantitativamente , ao olhar toda aquela estrutura bonitona montada na esquerda, nos dá sempre a sensação de que a situação está sob controle kkkk
E não deixa de ser, não? É como se já houvesse um rascunho de caminho completamente traçado. O backbone já está pronto! Ainda que seja alterado (e será) dá uma segurança danada. Imagina, se fosse no word, que loucura? Cara, eu amo o Scrivener! kk
Enfim, sigo acompanhando tua saga daqui! Feliz ano!