[Passageiro #59] Vivendo como um artista em Tbilisi
A vez em que fui parar na Geórgia (o país).
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No workshop de dezembro, que acontecerá no próximo dia 14, às 18h de Brasília, o assunto será LinkedIn para criadores.
Em novembro falamos sobre como criar uma newsletter de sucesso. Ao assinar qualquer um dos planos você pode assistir a gravação do encontro sem custos adicionais.
Para ler ouvindo2: The Palace, por Father John Misty.
1.
É possível que você nunca tenha ouvido falar em Tbilisi. Ou na Geórgia (o país) – no Google há mais informações sobre o território estadunidense do que sobre a antiga república soviética localizada na intersecção da Europa com a Ásia.
Encantadora e ainda pouco explorada por turistas ocidentais, a capital georgiana me atraiu em 2019 por dois motivos principais: 1) está fora do Espaço de Schengen – nômades que possuem apenas o passaporte brasileiro me entenderão – e 2) o custo de vida para quem ganha em real é baixo – ou era em 2019, pelo menos.
2.
– Why Georgia?3 – pergunta a simpática oficial de imigração e lembro da música do John Mayer.
– Um amigo disse coisas boas sobre o país – o amigo é o
, que além da propaganda elogiosa fez menção a nos encontrarmos em Tbilisi e simplesmente vazou antes de eu desembarcar na Geórgia; nos encontraríamos dois meses depois em São Petersburgo – na Rússia, não nos Estados Unidos da América – durante a minha turnê mundial de karaokê.– Você tem amigos aqui?
Eu achava que tinha, mas pelo visto não; penso, mas não digo.
– Não. Mas um amigo brasileiro esteve aqui há pouco tempo e adorou a Geórgia.
Ela folheia o meu passaporte e se impressiona com a quantidade de carimbos.
– Você viaja bastante. O que faz da vida?
– Sou escritor – aprendi com o tempo que essa resposta sempre gera novas perguntas e hoje me limito a dizer que trabalho com marketing digital (os oficiais da lei não parecem ter interesse em profissionais da área).
– Escreve livros?
– Meu primeiro livro será publicado no próximo mês.
– Mas então você não paga as suas contas com livros?
Ninguém paga as contas com livros no Brasil; penso, mas não digo.
– Sou freelancer. Trabalho com redação publicitária, esse tipo de coisa – “redação publicitária” é mais fácil de assimilar do que “marketing de conteúdo”, eu descobriria anos antes em um interrogatório semelhante no aeroporto JFK de Nova York.
– Hum. E você está aqui a turismo?
– Sim. Vou ficar duas semanas em Tbilisi.
Ela folheia novamente o passaporte.
– Interessante. Em qual país você estava antes de chegar aqui?
– Turquia.
– E antes?
– Rússia.
– E antes?
– Croácia. E antes disso Montenegro, Sérvia, França e Portugal – me adianto tentando encerrar a trívia sobre as minhas próprias viagens e sem citar Israel; porque lá não carimbam o seu passaporte.
Mais uma folheada.
– Não se vê muito brasileiros por aqui. Aproveite a estadia!
3.
Nesses anos todos vivendo uma vida nômade foram raras as vezes em que despachei a minha bagagem. Geralmente, viajo (ou viajava) com apenas duas mochilas: uma de 50 litros que cabe perfeitamente no compartimento superior da maioria das aeronaves e outra menor que acomodo embaixo do assento. Nessa viagem para Tbilisi a companhia aérea não permitiu que eu embarcasse com a mochila de 50 litros, de modo que tive que despachá-la.
Já com o carimbo georgiano em meu passaporte, sigo até a esteira para recuperar a minha bagagem. Percebo que um dos seguranças do aeroporto não tira os olhos de mim. Ele fala com alguém em uma espécie de walkie talkie e, assim que coloco a mochila nas costas, faz um sinal indicando que devo segui-lo até uma salinha, o que soa estranho, uma vez que já passei pela imigração.
– Preciso passar a sua bagagem no raio-x. De onde você está vindo? Não se vê muitos brasileiros por aqui.
– Turquia.
– E antes?
– Rússia.
– E antes?
4.
Eu estava vindo da Turquia porque, semanas depois de ter planejado uma viagem para a Geórgia saindo da Rússia, o presidente russo Vladimir Putin suspendeu os voos entre os dois países após uma nova crise diplomática – assim como fez recentemente com a Ucrânia em um conflito que ainda não teve fim, a Rússia tentou anexar um território da Geórgia em 2008 que também gerou uma guerra; os voos só foram restabelecidos em maio de 2023, gerando críticas justamente da Ucrânia, que sentiu-se traída pela Geórgia.
Difícil acompanhar, né?
Mas o que você precisa saber aqui é que, apesar de a Geórgia ter sido uma república soviética, o país tem poucas semelhanças com a Rússia; a língua georgiana não é eslava e o alfabeto não é o cirílico; em comum, talvez, apenas o fato de o ditador sanguinário Josef Stalin ter nascido em Gori, na Geórgia.
Para os georgianos, inclusive, confundir a sua nação com a Rússia é uma ofensa à memória dos muitos que morreram durante a invasão do Exército Vermelho em 1921; Tbilisi, de onde finalmente consigo sair do aeroporto após ter minhas duas mochilas inspecionadas, foi ocupada à força pelos russos.
5.
O taxista tem, pelo que consegui contar, apenas quatro dentes; os caninos superiores e os inferiores. Ele joga as minhas mochilas no porta-malas de um Lada que deve ser mais velho que eu, avisa que não fala inglês – “no English” – e pergunta se falo russo – “no Russian”.
Acende um cigarro e dá partida no Lada caindo aos pedaços. Pede novamente para ver o endereço do Airbnb e tenta engatar uma conversa em russo. “No Russian”, mas ele continua, dá risada; a Netflix legendaria a cena como “vozerio indistinto”.
6.
Oksana e Sofie, as anfitriãs que me recebem com uma cesta de frutas e uma garrafa de vinho branco – os georgianos juram que o vinho foi inventado por lá; há registros de mais de 8 mil anos da bebida –, transformaram uma casa centenária em um espaço criativo que já foi cenário de campanhas publicitárias da Gucci e, mais recentemente, de uma produção de Bollywood.
Quando vi as fotos do apartamento no Airbnb pensei: “é aqui que vou escrever a minha obra-prima”. Spoiler: hahahahahahahahahahahaha.
Todas as janelas têm vista para algum ponto icônico de Tbilisi e as paredes foram usadas como uma tela em branco por Oksana, artista russa baseada em Tbilisi, que criou um ambiente artístico e inspirador para profissionais criativos.
Há um piano em um dos quartos em que aprendi, com a ajuda de tutoriais no YouTube, a tocar o comecinho de 505, dos Arctic Monkeys.
7.
Se viver como um artista em Tbilisi foi barato?
Não. Definitivamente não.
Foi caro. Bem caro.
Se sou rico?
Não, não. Longe disso.
O segredo?
Irresponsabilidade financeira. Algo comum entre artistas.
Me siga para mais dicas.
🧳 Clube Passageiro
Perdeu o workshop de novembro do Clube Passageiro sobre como criar uma newsletter de sucesso?
Sem problemas. A gravação ficará disponível até 31 de dezembro de 2023.
Assine o Clube Passageiro para assistir o papo e confira a agenda dos próximos encontros:
Dezembro/2023: dia 14, 18h 🇧🇷, workshop LinkedIn para criadores 💼;
Janeiro/2024: dia 25, 18h 🇧🇷, workshop O processo de escrita de um livro de não ficção ✍️.
👨🎓 Cursos com inscrições abertas
✍️ Escrita Criativa
(apenas 12x de R$ 58,16)
Aulas gravadas; acesso vitalício. Informações aqui.
🎒 Escrita de Viagem
(apenas 12x de R$ 39,62)
Aulas gravadas; acesso vitalício. Informações aqui.
💼 Marketing Pessoal e Produção de Conteúdo no LinkedIn
(apenas 12x de R$ 89,52)
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🧠 Para ler, assistir e ouvir
Nômade Digital ultrapassou as 500 avaliações positivas na Amazon. Confira o que estão falando sobre o livro.
Achei bem interessante essa matéria da Folha sobre “a geração do quarto” – adolescentes que preferem ficar no quarto do que interagir com os adultos – porque eu meio que fui esse adolescente e acho que deu tudo certo; força para essa turma que apenas não quer ser incomodada.
Já recomendei aqui, mas reforço: Round 6: O Desafio, na Netflix. Saíram os episódios finais.
IDLES é uma das bandas mais interessantes que surgiram na última década. Essa performance no Tiny Desk mostra o porquê.
Tenho trabalhado ouvindo o álbum de flauta (!!!) do André 3000 do Outkast. Bom demais, sério.
🗣 Call to action aleatória para gerar engajamento
Qual foi a sua maior irresponsabilidade financeira?
✍️ Notas de rodapé
O Clube Passageiro é uma comunidade que se encontra uma vez por mês para papear sobre escrita, produção de conteúdo, monetização, livros e viagens – em bate-papos via Google Meet com duas ou mais horas de duração. Assine para participar dos próximos workshops e ter acesso ao nosso grupo fechado no Telegram.
Você sabia que a newsletter tem uma playlist com todas as músicas indicadas aqui? Ela é atualizada semanalmente.
“Por que Geórgia?”.
Matheus, se der, conta melhor sobre o spoiler hahahah vc não conseguiu escrever por algum motivo enquanto esteve aí, ou só chegou, analisou a situação e as circunstâncias e decidiu que não seria aí a terra natal da sua obra prima? Valeu, bjs!
Transformar uma viagem de 2 semanas pra Europa com grande parte dos custos cobertos em uma viagem de 3 meses e gastar todo o dinheiro que juntei ao sair do escritório pra não ficar sem dinheiro enquanto procuro outro trampo. Sem grana (ainda), porém muito feliz.