[🏴☠️ Medo e Delírio #9] Um milico no golfe
Em uma tarde entre os riquinhos do esporte mais chato dos Jogos Olímpicos, acompanho o sul-coreano que tenta ganhar uma medalha para fugir do serviço militar obrigatório.
💰 Mentoria Monetize
Estou com oito vagas abertas (quatro já foram preenchidas) para a Mentoria Monetize – uma mentoria para você monetizar o seu conhecimento e ganhar dinheiro na internet; estou oferecendo 10% de desconto para pagamentos à vista exclusivamente neste link; você também pode realizar o pagamento (sem desconto) em seis parcelas neste outro link.
Será a última turma de 2024 – e não, não é “gatilho da escassez”.
Saiba mais e garanta a sua vaga neste link.
🎧 Para ler ouvindo1: All Along the Watchtower, por Jimi Hendrix.
✍️ Por Matheus de Souza
PARIS, FRANÇA
1.
“O que diabos eu vim fazer aqui?”, é o que me pergunto assim que chego ao Le Golf National, o campo de golfe com capacidade para 80 mil riquinhos em Guyancourt, a sudoeste do centro de Paris.
Até então, o golfe só esteve presente nos Jogos Olímpicos em quatro oportunidades: Paris 1900, Saint Louis 1904, Rio 2016 e Tóquio 2020. O suposto esporte ficou de fora do Programa Olímpico por mais de 100 anos, voltou na edição carioca e, numa tarde com mais perguntas do que respostas, reflito sobre por que diabos isso aconteceu.
As regras deste suposto esporte são bem simples: ganha quem acertar a bola nos buracos no menor número possível de tacadas. São 18 buracos, de modo que caso você, no papel de espectador, queira acompanhar o desempenho de um atleta específico, deve andar de um buraco a outro.
Imagino que jogar seja divertido (ainda mais se você tem um carrinho para te levar de um buraco a outro), não duvido disso, de verdade, mas torço, do fundo do meu coração, que os estimados leitores desta newsletter nunca tenham, em hipótese alguma, pisado em um campo de golfe com o objetivo de assistir um campeonato deste suposto esporte.
2.
Aproximo-me de um buraco onde há alguma movimentação acontecendo. Duas voluntárias levantam placas de “silêncio” para o distinto público do Le Golf National que se amontoa para assistir uma tacada de Tom Kim, sul-coreano que é um dos melhores jovens jogadores do PGA Tour, o mais famoso circuito de golfe que nos últimos anos tem perdido atletas para os petrodólares do LIV Golf, o circuito do Fundo de Investimento Público da Arábia Saudita que, de forma semelhante ao sportwashing feito no futebol, tem investido pesado neste suposto esporte.
Não entendo de golfe, mas Tom Kim parece nervoso e erra uma tacada fácil que resulta em tímidos “ahhh” do distinto público; ao meu lado, um adolescente com a cútis de quem acaba de chegar das férias em Ibiza e nunca precisou pagar um boleto na vida tapa os olhos com as mangas do pullover azul bebê pendurado em seus ombros.
Dá para ver quem nasceu rico e quem ficou rico. Os movimentos dos herdeiros são mais cadenciados, a coluna mais ereta. Há uma calma na fala, uma educação no tratamento. Já o rico emergente porta-se de maneira diferente, ele é mais enérgico. O rico emergente conhece o estresse do trabalho, aquele sentimento de será que vou conseguir pagar as contas do mês que o herdeiro não tem. O herdeiro pede o baldinho de frango frito com batatas que custa 24 euros sem preocupar-se com a conversão, sem fazer contas mentais sobre o que consegue comer com 24 euros no centro de Paris, um burrito e duas cervejas no restaurante mexicano perto do Moulin Rouge, o herdeiro veste roupas de marca, mas é minimalista no estilo, as cores são sóbrias, enquanto o rico emergente quer mostrar que é rico, parece um outdoor ambulante, quanto maior a logo da marca chique no boné, no óculos, na camiseta e até no cinto melhor, Louis Vuitton, Prada, Gucci, Armani, Burberry, tudo colorido e extravagante.
E o Tom Kim erra outra tacada.
Tom Kim tem 22 anos. Na Coreia do Sul, a lei exige que os jovens realizem 18 meses de serviço militar antes do 28º aniversário.
Existem algumas maneiras de fugir do alistamento obrigatório. Famílias ricas, por exemplo, costumam enviar seus filhos para escolas estrangeiras para ganhar dupla cidadania. E tem também o esporte.
Como um incentivo extra para melhorar o desempenho do país nos Jogos Olímpicos, a Coreia do Sul introduziu uma regra nos anos 1970 que isenta medalhistas olímpicos do serviço militar. Mais tarde, a regra incluiria ainda o ouro nos Jogos Asiáticos – o que safou Son Heung-mi, o maior jogador de futebol sul-coreano da história e estrela do Tottenham, da Inglaterra, de interromper sua carreira por 18 meses.
3.
A não ser que Happy Gilmore, o personagem de Adam Sandler em Um maluco no golfe, apareça com um taco de hóquei para agitar as coisas, sei que não vai ficar melhor que isso – gritinhos contidos de “ahhh” e “uhuul” em casos de erros e acertos, respectivamente –, de modo que, pensando já em garantir meu lugar no busão – uma frota de ônibus gratuitos foi disponibilizada no trajeto Guyancourt-Paris –, decido que é hora de ir embora.
Um hobby que criei durante os Jogos Olímpicos é tentar descobrir até onde consigo chegar com a minha credencial e um pouco de cara de pau – um negócio meio Impostor do Pânico.
Como mencionado na 2ª edição desta newsletter:
“A lei Evin, promulgada em janeiro de 1991, restringe a venda de bebidas alcoólicas nos estádios franceses.
Existem, no entanto, exceções. Na Copa do Mundo de rugby, em 2023, os organizadores conseguiram uma autorização especial para vender álcool à margem dos jogos. Essa exceção, porém, tem um limite de competições por ano e, por essa razão, o Comitê Olímpico Internacional abandonou a ideia de solicitar uma flexibilização.
‘Paris 2024 organizará mais de 700 competições em 15 dias’, lembrou o porta-voz do COI. ‘E a lei só concede isenção para dez eventos por organizador e por ano na mesma cidade’, explicou.
E aí tem a exceção da exceção. Os camarotes VIPs são considerados espaços privados e se beneficiam de uma legislação diferente – você acha mesmo que o pessoal cheio de grana ficaria de bico seco? Os ricos sempre têm os seus privilégios.”
Minha estratégia para descobrir até onde consigo chegar consiste em apressar o passo, mostrar a credencial rapidamente e de forma confiante enquanto finjo falar em inglês no celular – interrompo a conversa fictícia para usar duas palavras-chave em francês: “pardon” e “merci”.
Passo sem problemas pelo segurança do camarote reservado aos familiares dos atletas e decido ficar. Peço uma taça de champagne e uma tábua que queijos.
– Acompanhando quem? – me pergunta um simpático rico vestindo uma camiseta do Team GB (o Time da Grã-Bretanha, não o Canal do Galvão Bueno).
– O argentino. – respondo confiante.
O simpático rico do Team GB dá um sorriso amarelo e vai embora.
Eu descobriria mais tarde, já no busão, que Emiliano Grillo, o argentino, tretou nas redes sociais com torcedores ingleses logo após o Aberto Britânico de Golfe em 2023. O motivo? As Malvinas.
4.
Enquanto peço mais uma taça de champagne e um cachorro-quente para a viagem (um rico – herdeiro ou não – jamais faria isso), acompanho na TV do camarote o choro de Tom Kim após ter ficado fora da disputa por medalhas.
Em 2026, nos Jogos Asiáticos que serão disputados no Japão, ele terá mais uma chance de escapar do serviço militar. Em 2028, nos Jogos Olímpicos de Los Angeles, a última.
💌 Os parceiros da newsletter Passageiro
Assinantes da newsletter Passageiro podem assinar os seguintes serviços com descontos especiais:
Scrivener (o software que eu utilizo para escrever os meus livros);
Wise (o cartão multimoedas que eu utilizo em minhas viagens para enviar meus reais para qualquer lugar do mundo e convertê-los nas moedas locais);
SafetyWing (o seguro-viagem favorito nos nômades);
NordVPN (o único jeito de assistir a CazéTV e os outros canais brasileiros aqui na França – ou em qualquer lugar do mundo);
Flodesk (a ferramenta de e-mail marketing que não te cobra um rim para você enviar suas campanhas e fazer suas automações).
As Olimpíadas acabaram, mas tomara que Medo e Delírio tenha sobrevida. Tenho certeza que há muitas histórias a serem contadas ainda.
Abraço, Matheus!
E você estava disfarçado de herdeiro ou de novo rico?