[đ´ââ ď¸ Medo e DelĂrio #6] A primeira vitĂłria de uma brasileira no badminton
Juliana Viana, piauiense de 19 anos, nĂŁo ganhou medalha, mas fez histĂłria no badminton â um dos esportes mais divertidos das OlimpĂadas.
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đ§ Para ler ouvindo1: I Guess Time Just Makes Fools of Us All, por Father John Misty.
âď¸ Por Matheus de Souza
01 de agosto de 2024
PARIS, FRANĂA
1.
De quatro em quatro anos surge o questionamento sobre por que diabos jogar peteca ĂŠ um esporte olĂmpico. Fui atrĂĄs de respostas em uma segunda-feira que fez um calor do cĂŁo em Paris para o azar de quem, assim como eu, precisou utilizar o metrĂ´ da capital francesa que parecia ter sido aromatizado com o body splash da Virginia Fonseca2.
A Arena Porte de la Chapelle, nova casa do Paris Basketball e um dos legados dos Jogos OlĂmpicos, tem capacidade para pouco mais de 8 mil pessoas, mas o fato de trĂŞs partidas simultâneas de badminton acontecerem por vez (sĂŁo mais de 200 partidas durante os Jogos!) com atletas de vĂĄrias nacionalidades competindo entre si em duplas ou sozinhos torna a atmosfera uma espĂŠcie de MaracanĂŁ misturado com MarquĂŞs de SapucaĂ.
Sento ao lado de uma famĂlia de dinamarqueses que esperam os atletas do seu paĂs competir â eu descobriria mais tarde que o badminton ĂŠ bastante popular na Dinamarca; na minha frente, torcedores indianos vibram a cada ponto do jovem Lakshya Sen, esperança de medalha em Paris; atrĂĄs de mim, sul-coreanos torcem pela dupla mista do seu paĂs em uma disputa acirrada contra os tailandeses; jĂĄ eu torço para a dupla de tailandeses enquanto espero a piauiense Juliana Viana, de apenas 19 anos, entrar em quadra.
2.
Juliana, natural de Teresina, no PiauĂ, praticava balĂŠ e tinha apenas seis anos quando conheceu o badminton no clube Joca Claudino Esportes, espaço que tornou-se referĂŞncia da modalidade em todo o paĂs, e decidiu trocar as sapatilhas pela raquete.
Juliana ĂŠ daqueles talentos que aparecem de quatro em quatro anos em esportes nĂŁo muito populares, mas que em tempo de Jogos OlĂmpicos nos fazem vibrar; Juliana ĂŠ desses talentos que abraçam as oportunidades, trabalham duro e que, quando viram notĂcia, inspiram outros talentos a fazerem o mesmo; Juliana ĂŠ desses talentos cujas histĂłrias de vida nos fazem sair da inĂŠrcia.
Em 2015, Juliana â que faço questĂŁo de reforçar: nascida em Teresina, no PiauĂ â fez intercâmbio na China. Em 2016, pouco antes de completar 12 anos, mudou-se para a Espanha, onde morou por trĂŞs anos para se dedicar ao badminton. Nessa ĂŠpoca, ainda adolescente, chegou a disputar competiçþes no sub-19. Em 2020, aos 15 anos, recebeu sua primeira convocação para competir pela seleção adulta. JĂĄ em 2023, disputou o Campeonato Mundial pela primeira vez, sendo a mais nova do torneio e competindo com seus Ădolos. Em Paris, aos 19 anos, beneficiada pelo programa Bolsa Atleta, pode, enfim, realizar o sonho de disputar os Jogos OlĂmpicos â mas nĂŁo sĂł; Juliana fez histĂłria.
3.
Em sua estreia nos Jogos OlĂmpicos, no Ăşltimo sĂĄbado (27/07), Juliana perdeu para a tailandesa Supanida Katethong. A piauiense fez uma boa partida e esteve Ă frente no placar em diferentes momentos, mas sofreu a virada, perdendo os dois sets por 21-16 e 21-19. Para avançar de fase, Juliana precisaria vencer Sin Yan Happy Lo, atleta de Hong Kong, e torcer por uma derrota da sua algoz tailandesa para a prĂłpria Sin Yan Happy Lo â alĂŠm de uma combinação especĂfica de pontos para que os critĂŠrios de desempate a favorecessem, uma vez que, neste caso, todas do grupo teriam uma vitĂłria cada.
O jogo contra Happy Lo começa equilibrado. Tento prestar atenção em cada detalhe enquanto na quadra ao lado a dupla mista sul-coreana busca uma virada inacreditĂĄvel contra os tailandeses. TrĂŞs jogos simultâneos. Tudo acontece muito rĂĄpido. Juliana e Happy Lo se alternam Ă frente do placar e a atleta de Hong Kong chega a abrir trĂŞs pontos de vantagem. Juliana empata, 17-17, mas logo Happy Lo abre 19-17. âComo assim, Juliana? Vamo! A Happy Lo nem ĂŠ tudo issoâ, eu que nĂŁo entendo nada de badminton começo a entender porque jogar peteca ĂŠ um esporte olĂmpico: ĂŠ emocionante; ĂŠ contagiante; ĂŠ muito mais legal que hĂłquei na grama (artificial). E Juliana foi. Virou para 21-19, com quatro pontos seguidos, e venceu o primeiro set.
No segundo set, Juliana deslancha apĂłs virar novamente sobre Happy Lo, que chegou a anotar 8-6. De longe vejo que Happy Lo nĂŁo parece muito feliz â vocĂŞ acharam mesmo que eu nĂŁo faria essa piada? Mais consistente, Juliana vai abrindo vantagem. Esqueço que outros dois jogos estĂŁo acontecendo simultaneamente atĂŠ a dupla francesa entrar em quadra e a torcida local cantar a Marselhesa a plenos pulmĂľes; e ĂŠ com a Marselhesa como trilha que Juliana fecha a partida em um 21-14 histĂłrico; pela primeira vez na histĂłria dos Jogos OlĂmpicos, uma atleta brasileira vence uma partida de badminton.
4.
A matriarca do grupo de dinamarqueses me parabeniza pela vitĂłria de Juliana â estou fardado com uma camisa do Brasil e um bonĂŠ do Ayrton Senna (que mais tarde me renderia uma selfie com GalvĂŁo Bueno, mas isso ĂŠ papo pra outro dia).
â Ă a primeira vez que uma brasileira vence uma partida no badminton. â digo para a senhora dinamarquesa
â EntĂŁo estamos diante de um momento histĂłrico, nĂŁo ĂŠ mesmo? Que ela abra oportunidades para as novas geraçþes.
â Ela ĂŠ a nova geração. Ela tem apenas 19 anos. Ă sĂł o começo. â respondo como um coach responderia.
5.
Katethong, a atleta tailandesa, vence Happy Lo â que mais uma vez nĂŁo deve ter ficado muito feliz. Com o resultado, Juliana ĂŠ eliminada dos Jogos OlĂmpicos de Paris. Mas isso pouco importa. Nem toda heroĂna olĂmpica ganha medalha. Em entrevista para o site Surto OlĂmpico, Juliana fez um balanço de seu desempenho e falou sobre suas expectativas para Los Angeles 2028.
"Eu saĂ daqui muito feliz, acho que foi de forma positiva, por mais que tenha tido o nervosismo e tudo mais, nĂŁo sĂł na mente, mas em quadra, acho que os Jogos OlĂmpicos sĂŁo mais que isso, ĂŠ a experiĂŞncia em geral. A experiĂŞncia na Vila OlĂmpica, eu tambĂŠm tĂ´ aproveitando muito a Vila, tirando foto com grandes nomes no esporte3, brasileiro e tambĂŠm do estrangeiro, entĂŁo acho que isso tudo me veio a favor, sabe, fez eu sentir esse espĂrito olĂmpico, eu realmente vivi o espĂrito olĂmpico dentro e fora de quadra, entĂŁo eu saĂ daqui muito positiva, com muita força de vontade, porque eu vi que ĂŠ muito possĂvel passar da fase de grupo, sabe, nĂŁo ĂŠ um bicho de sete cabeças, e eu posso ir mais alĂŠm, mais alĂŠm, e agora o objetivo ĂŠ voltar e jĂĄ começar a me preparar para as OlimpĂadas de Los Angeles em 2028, jĂĄ no dia seguinte, entĂŁo meu foco ĂŠ esse. Eu espero que as cinco modalidades do Brasil se classifiquem. Foi por muito pouco que a dupla masculina e a mista nĂŁo estiveram aqui. A feminina tambĂŠm. EntĂŁo eu vi com esse sentimento de âpoxa, eu poderia estar compartilhando esse momento com eles tambĂŠm.â EntĂŁo eu representei todos aqueles que me ajudaram, que eu treino lĂĄ na seleção. Mas para a prĂłxima eu acho que realizaria outro sonho meu. O que eu jĂĄ realizei, jĂĄ estou realizando esse momento histĂłrico, ĂŠ o badminton crescer, crescer e conseguir ir com cinco modalidades completas para Los Angeles. Eu acho que eu vou inspirar pequenos, novos talentos pelo Brasil inteiro. O Brasil ĂŠ muito grande, entĂŁo vamos encontrar gente aĂ para começar o badminton e ter sonhos como o meu."
VocĂŞ jĂĄ estĂĄ inspirando, Juliana.
Assim que as OlimpĂadas acabarem, vou procurar um lugar para praticar badminton aqui em ParisâŚ
Obrigado por me apresentar o badminton, Juliana.
đŁ Call to action aleatĂłria para gerar engajamento
Dos esportes, digamos, mais âalternativosâ dos Jogos OlĂmpicos, qual ĂŠ o seu favorito?
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Por essa referĂŞncia acho que o leitor nĂŁo esperava, mas depois que trombei com a equipe do LĂŠo Dias na Casa Brasil fazendo tambĂŠm a cobertura dos Jogos, estou mais cabeça aberta â e fofoqueiro.
Gente como a gente. Uma querida.
Desde que comecei a jogar tênis eu passei a nutrir um carinho por todos os esportes com raquete. Badminton Ê um daqueles que eu penso "uma hora preciso parar pra assistir com calma". Essa news jå foi um ótimo começo.
E a maturidade da Ju lidando com a eliminação Ê admiråvel. Ela sai vencedora, e nem precisou de uma medalha pra isso.
Forte abraço, Matheus.
Meu pai era professor de judĂ´ e eu treinei dos 7 aos 13 anos - faixa verde. Naquela ĂŠpoca mulheres nĂŁo podiam participar de campeonatos, sĂł os homens. E quando tinha algum campeonato interno, da academia, eu lutava com meninos de mesmo peso, ou seja, jĂĄ começava em desvantagem. E ainda tinha a cobrança dos coleguinhas que jĂĄ tiravam sarro (logo de cara) do meu oponente dizendo: nĂŁo vai perder pra mulher, nĂŠ? EntĂŁo foram poucas as vezes em que consegui ganhar alguma luta. Mesmo assim, gostava do esporte, era bem legal. Fico muito feliz em ver as lutas de judĂ´ nas olimpĂadas, principalmente as das mulheres. Pode nĂŁo parecer um esporte alternativo, mas na minha infância, era bem alternativo para nĂłs, mulheres.